A Serra do Martins, no sertão potiguar, é um dos lugares mais aprazíveis do mundo. Visitando-a em companhia de Câmara Cascudo, o grande escritor Mário de Andrade não se conteve diante de tanta beleza e exclamou:
– Oh! Isto é Teresópolis!
Cascudo, de pronto, rebateu:
– Não! Teresópolis é que é Martins.
Na verdade, Martins nada fica a dever, em beleza natural, às estâncias serranas mais famosas, como Teresópolis, Campos do Jordão, Gramado, Garanhuns, etc. É preciso, porém, que o seu potencial turístico seja, devidamente, explorado. Sem agressões ao meio ambiente.
A cidade, no alto da serra, conta com bons hotéis, pousadas e outros atrativos, além da paisagem e do clima. Fundou-a, por volta de 1742, o sertanista Francisco Martins Roriz, daí o nome. Quase um século depois, a Lei Provincial nº 71/1841 elevou o povoado de Martins à categoria de Vila, Município e Comarca da Maioridade (homenagem a D. Pedro II, cuja maioridade fora antecipada, possibilitando-lhe a ascensão ao trono). Em 1847, passou a chamar-se Cidade da Imperatriz (D. Teresa Cristina). O nome Martins voltou após a proclamação da República.
ROTEIRO TURÍSTICO E CULTURAL
O casario antigo, remanescente do século XIX, desperta algum interesse, apesar de inúmeras deturpações modernosas. Casas de cumeeiras altas ligam-se umas às outras, em cada lado de rua, formando blocos. Portas e janelas simples, não raro arqueadas, dando diretamente para as calçadas, onde a gente costuma, de tarde ou à boca da noite, colocar cadeiras para as rodas de conversa.
Destaca-se a igreja matriz (construção de 1815), de linhas sóbrias e majestosas. É um dos maiores templos do Rio Grande do Norte. Bonito por fora, porém sem maiores atrativos por dentro, salvo algumas imagens barrocas, pois sofreu remodelações desfiguradoras.
Importante edificação do século XIX, o Sobrado – “Edifício Pax” – aloja o Museu Histórico, Arqueológico e Etnográfico. Construção de 1874, dois andares, além do térreo, varanda com grade de ferro trabalhado, paredes largas, o Sobrado pertenceu ao Tenente-Coronel José de Souza Martins Pereira e, depois, ao genro deste, senador Almino Afonso, abolicionista histórico.
ACERVO HISTÓRICO E ARTÍSTICO
Na sala da diretoria da Escola Estadual Almino Afonso encontra-se uma coleção de estatuetas em bronze, doação do Cel. Demétrio Lemos, um benemérito da terra. São dezenas de peças, a maioria de indiscutível valor histórico e artístico. Pelo menos, umas cinco (figuras de Miguel Ângelo, Guttemberg, Galileu, Júlio César e Milton) impressionam. Sem dúvidas, um raro conjunto. Coisa notável, por si só a justificar uma visita à cidade.
Na biblioteca da escola, algumas raridades bibliográficas, entre as quais, edições de luxo, em formato gigante, de “Os Lusíadas”, “O Inferno”, de Dante, e “Orlando Furioso”, de Ariosto, com ilustrações de Gustavo Doré – doadas pelo Cel. Demétrio.
CASA DE CULTURA
Inaugurada em 2003, a Casa de Cultura José Câmara conta com auditório (120 lugares), biblioteca, pinacoteca, área para apresentação de grupos folclóricos e estandes para o artesanato regional.
GRUTA DAS TRINCHEIRAS OU CASA DE PEDRA
Situada no sopé da serra, no lugar Trincheiras, causa impressão, especialmente pelo fenômeno da estalactite e estalagmite, e pelo seu feitio: é ver uma casa, com “salão”, “salas”, “corredores” e “quartos, inclusive um misterioso quarto escuro.
Afora os visitantes, vindos de municípios vizinhos, também andaram pela gruta pessoas ilustres, como o sábio Adolpho Lutz e o poeta Henrique Castriciano. Este, inspirado na beleza da estalactite, deixou escrito na própria pedra famoso poema, que vale a pena transcrever:
NA SOLIDÃO
A lágrima sem fim, a lágrima pesada,
Que eternamente cai do alto desta gruta,
Representa alguma alma estranha e desolada
Que mora a soluçar dentro da rocha bruta!
Esta alma, quem será? Não sei! Mistério fundo…
Entretanto, eu pressinto alguém que se debruça,
E, baixinho, me diz, num gemido profundo:
– Existe um coração na pedra que soluça!
OS SÍTIOS
A chã da serra é retalhada em minifúndios. Experimentou-se, tempos atrás, a cultura do cafeeiro. Mas o que atrai nestes sítios é a grande quantidade de fruteiras: jaqueiras, cajueiros, mangueiras, mamoeiros, bananeiras e outras variedades em menor quantidade. Nos quintais plantam-se até parreiras. E já vi uma figueira, comi figos de Martins. Acho que macieira, em se plantando, também dá.
MIRANTES
A Pedra Rajada é um enorme lajedo cobrindo pedaço da serra, de alto a baixo. Bem perto encontra-se o Mirante do Canto, com restaurante e bar. No outro lado da serra, pras bandas do Jacu, o Mirante da Carranca, também bar e restaurante. De ambos os mirantes descortinam-se panoramas belíssimos.
OS SANTUÁRIOS DA RUA DAS PEDRAS
Na antiga Rua das Pedras erguem-se dois santuários de valor histórico: a capela do Rosário e o nicho de Nossa Senhora do Livramento, este também importante sob o ponto de vista artístico.
Terminada de construir em 1758, por Martins Roriz, a capela do Rosário sofreu (o verbo é bem este), na década de 1930, uma remodelação que a desfigurou totalmente. Apresenta fachada vulgar, incaracterística.
A poucos metros da capela, o nicho, em toda a sua graça barroca, mandado construir pelo cidadão Luiz Ferreira de Melo, ao tempo da Guerra do Paraguai, em pagamento de uma promessa a Nossa Senhora do Livramento, por haver esta livrado os seus netos do recrutamento forçado.
*MANOEL ONOFRE JR é Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.
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